Desapropriação forçada
Rolling Stone Brasil investiga a situação habitacional e a expansão
imobiliária em São Paulo
A maior metrópole do país, São Paulo, tem hoje
cerca de 800 mil famílias morando em favelas ou assentamentos precários. O
número corresponde à quase um terço da população da capital. Nos últimos anos,
intimidações armadas, desapropriações violentas e incêndios misteriosos, denúncias de moradores que já não acreditam mais em causas
acidentais para as destruições de suas moradias.
Por mês, a Secretaria de Habitação gasta de R$ 4,5 milhões com o aluguel para
famílias que aguardam a construção de prédios. Essas pessoas, transportadas de
um lugar pra o outro sem planejamento, são o espelho dos descaminhos da política
de planejamento urbano da capital mais rica do país. De acordo com relatora
especial da Organização das Nações Unidas (ONU), Raquel Rolnik, a política
habitacional utilizada pela prefeitura é "uma máquina de produzir novas
precariedades".
Grandes eventos como a Copa do Mundo e obras de infraestrutura, na linha do
Rodoanel, são responsáveis por remoções e despejos realizados sem nenhum
respeito. "Às vezes, as famílias acabam em bairros piores, a 30, 40 quilômetros
de suas moradias originais, quando o correto é que a condição nova seja sempre
melhor", critica.
Raquel ainda acha estranho que, em grande parte dos casos, essas regiões
coincidam com as áreas de maior valor no mercado imobiliário. E os moradores
parecem concordar com a relatora da ONU. "Ninguém pode provar nada. Mas quem
está aqui há muitos anos, como eu, desconfia", comenta um dos moradores das
favelas atingidas por incêndios suspeitos.
Outra moradora que perdeu a casa em uma dessas ocasiões é mais enfática: "Foi
criminoso, temos certeza". A afirmação vem embasada na demora dos bombeiros, que
levaram mais de uma hora para chegar ao local e ainda foram com pouca água para
combater o fogo.
Enquanto em 2008 e 2009 o número de ocorrências de incêndios em favelas era
inferior a 80, no ano passado, de janeiro a setembro, a cifra pulou para 95. Em
2011, o corpo de bombeiros já registra 99 casos. E muitos acontecem em áreas que
passam por litígio ou urbanização.
Procurada pela reportagem, a prefeitura de São Paulo apresenta uma opinião
bem diferente e otimista em relação às remoções. Aliás, o termo nem é utilizado
pelo órgão. "Quem acha que a gente faz remoção é um ignorante de pai e mãe. A
gente não desaloja ninguém. A gente constrói para eles", diz o secretário da
habitação Ricardo Pereira Leite.
Ricardo afirma ainda que todas as famílias de favelas em processo de
urbanização continuam na mesma casa, que é reformada. "Eu chamo de upgrade",
completa e é apoiado por Elisabete França, superintendente de habitação popular
da Secretaria Municipal de Habitação. "Eu chamo de ganhar na loteria",
acrescenta.
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